segunda-feira, 1 de setembro de 2008

A entrevista do Ministro Marco Aurélio de Mello sobre o aborto

Na ultima edição da revista VEJA, o ministro do Supremo Tribunal , Marco Aurélio Mello concedeu uma entrevista a respeito de um tema muito complexo; o aborto de fetos anencéfalos. Aproveitando o tema, o ministro foi além ao falar sobre o próprio tema do Aborto, direito de escolhas, etc.

Já postei no blog um artigo sobre a questão do aborto e agora faço alguns comentários em determinadas respostas dadas.

O senhor defende a tese de que esse tipo de aborto de fetos anencéfalos seja caracterizado como "interrupção terapêutica da gestação". Qual é o amparo legal para essa proposta?
O Código Penal viabiliza a interrupção terapêutica da gravidez quando há risco de vida para a mulher. No meu entender, o risco de vida não é apenas uma questão relacionada à integridade física, mas à saúde num sentido muito mais amplo. Estou me referindo aqui à saúde psicológica da gestante. A gravidez de um feto anencéfalo traz danos irreversíveis à mulher tanto do ponto de vista físico quanto do psicológico. E digo mais: quando o Código Penal foi elaborado, em 1940, não havia tecnologia médica para detectar malformações fetais. Se esse tipo de diagnóstico fosse possível naquele tempo, muito provavelmente a interrupção da gestação de fetos anencéfalos já estaria prevista no Código Penal.

Se em 1940, já houvessem meios de diagnosticar fetos anencéfalos ja estaria previsto no código penal o aborto ou a interrupção da gravidez? Mas em 1940 a adultério, pelo menos por parte da mulher era classificado como crime, não é mesmo? O aborto é uma questão acima de tudo moral, razão pela qual a mulher pode interromper a gravidez quando é fruto de estupro. Então entendo que mesmo que fosse possivel na época, diagnósticos tão complexos, ainda assim a legislação esbarraria como esbarra na questão moral ou religiosa que faz parte da formação do povo. E qualquer pesquisa recente comprova isso. O aborto ainda é considerado uma escolha errada pela maioria da população e portanto deve continuar proibida.

Por outro lado, acho perigoso a liberação de interrupção de gravidez por conta de "danos emocionais". Exagerando um pouco, o que impede uma mãe de sofrer forte dano emocional por descobrir que seu filho em gestação será portadors de sindrome de down, ou má formação de membros ou outras doenças que claramente serão um peso enorme na vida da criança e da família? Esse dano emocional não é mais forte do que a de um feto com anencefália, cuja vida se extinguirá em pouquissimo tempo após o parto? Dano emocional por dano emocional o que impedirá alguem de demandar o mesmo direito em outras situações, numa espécie de busca da eugênia por conta de evitar danos emocionais a frente?


O senhor acredita que a maior flexibilização do STF abre a possibilidade para a discussão do aborto em geral?
Sem dúvida. O debate atual é um passo importante para que nós, os ministros do Supremo, selecionemos elementos que, no futuro, possam respaldar o julgamento do aborto de forma mais ampla. O sistema atual está capenga. Por que a prática de aborto de fetos potencialmente saudáveis no caso de estupro é permitida? Esse tema é cercado por incongruências. Temos 1 milhão de abortos clandestinos por ano no Brasil. Isso implica um risco enorme de vida para a mulher. Na maioria das vezes, o aborto é feito em condições inexistentes de assepsia, sem um apoio médico de primeira grandeza. Há uma hipocrisia aí. O aborto é punido por normas penais, mas é feito de forma escamoteada. Nosso sistema é laico. Não somos regidos pelo sistema canônico, mas por leis. A sociedade precisa deixar em segundo plano as paixões condenáveis.

Me parece obvio que o sistema atual está capenga. O mundo está muito diferente do que em 1940; mas a obrigação de mudar o sistema não é do Supremo Tribunal, mas do poder que representa o povo, no caso o legislativo e é esse que deve ser acionado para transformar as leis e tornar o sistema menos capenga.

A prática do aborto em casos de estupro não está relacionado a saúde do feto, mas ao fato de que a mãe foi vítima de uma violência e não pode ser exigida dela que tenha de honrar com todas as suas obrigações para com uma criança que sempre lhe lembrará de um pesadelo. Ademais mesmo assim, a mulher não é obrigada a abortar.

Temos 1 milhão de abortos clandestinos por ano no Brasil? Como se chega nesse número se estamos a falar de: a) uma ato ilícito e, b) feito de forma clandestina? As mães responderam algum tipo de pesquisa confidencial? Baseia-se em qual dado sólido para se afirmar esse número? Se alguem tiver a resposta, por favor me explique.

É feito em condições inexistentes de assepsia, sem apoio médico de primeira grandeza. Me parece que isso é uma questão de pobreza e não do aborto em sí. Uma amigade família fez uma operação de catarata em um hospital e ela possui um plano de saúde. Está internada porque pegou uma infecção hospitalar no olho correndo o risco de ficar cega. Dá pra imaginar a situação pelo SUS? E a maternidade em Belém com uma quantidade enorme de bebes mortos após o nascimento? Todos atendidos pelo sistema público e ninguem até o presente momento deu uma explicação satisfatória para a mortandade. Então o aborto deixar de ser crime não significa que mulheres deixaram de morrer, porque as pobres continuaram a usar meios mais "rápidos" e "baratos". Não é justamente o que ocorre nas clínicas de estética nas quais mulheres morrem em operações plásticas, porque foram buscar medicos mais baratos?




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