quarta-feira, 16 de julho de 2008

O caso Daniel Dantas e o relatório sobre a imprensa

Contam que solicitaram a Isaac Newton que resolvesse um problema matemático proposto e que estava sem solução por alguns anos. Em poucas horas, Newton elaborou a resposta certa, mas solicitou que fosse publicada sem a identificação de seu nome. O autor do problema, no entanto, disse que pela garra é que se conhecia o leão, reconhecendo na resposta a genialidade de Newton.

A pedido do anônimo comentarista de post anterior, faço uma breve e claro, imperfeita e superficial análise da parte do relatório referente a jornalistas a serviço de Dantas.

A parte do relatório voltado a questão da imprensa começa com esse trecho:

No curso da presente investigação nos deparamos com diálogos e emails que apontam para a ocorrência de manipulação da midia pela organização criminosa investigada. Pudemos notar que tudo o que se publica com relação aos interesses do grupo é acompanhado de perto e cuidadosamente – pág 148

Venhamos e convenhamos, qual é a empresa, grupo financeiro ou até mesmo pessoa física que não acompanhe de perto o que é publicado sobre seus interesses? Qual o crime de possuir esse tipo de interesse? Aliás, quanto maior a empresa maior esse interesse e cuidado com a mídia.

Não é preciso ir muito longe. Qualquer participante de Reality Show depois que sai, faz o quê como primeira providência? Acertou para quem respondeu: Contratar um assessor de imprensa.

Aliás não foi com esse objetivo, o de aparecer bem na mídia, que a polícia vazou para a Rede Globo que iria efetuar as prisões, tanto que as equipes da globo acompanharam todas as equipes e teve a primazia do furo de reportagem? Ou alguém acha que os profissionais da Rede Globo resolveram acampar em frente ao prédio da polícia e saíram seguindo cada policial a espera de um furo jornalístico?

Depois vamos para a página 150: ...comprar e manipular alguns meios...Mais uma vez um outro caso...assassinando reputações...

No ínicio falei de Newton. Pois é se é pelas garras que se conhece o leão, são pelas citações que se reconhecem as fontes e nesse trecho, fica, ao menos para mim, bastante claro que esse trecho do relatório foi grandemente influenciado pelo conjunto de textos chamado Dossiê VEJA de Luis Nassif.

A título de discutir o tipo de jornalismo praticado pela revista VEJA, a maior parte dos capítulos gira em torno da suposta ligação entre Daniel Dantas e a direção de VEJA além de dois colunistas da revista, Jardim e Mainardi. Escracha outro colunista, Reinaldo Azevedo e usa como constante o termo, “assassinato de reputação” ao citar as colunas dos jornalistas acima bem como as reportagens de Janaina Leite, à época repórter da Folha de São Paulo.

Nassif é o autor dessa alcunha “assassinato de reputações” e por isso, toda vez que alguém usa esse termo, está citando Luis Nassif mesmo que indiretamente. Adiante;

Mais a frente nas próximas páginas, os emails transcritos demonstram que a coluna de Mainardi com documentos que recebeu da Itália foram citados e que seria importante traduzir para saber o que há de interessante nos documentos. Ora, a acusação de Nassif é que Mainardi era jornalista-cela de Dantas; e o inquérito do delegado Protogenes (que recebeu fartos elogios e até orações de proteção de Nassif em seu blog); demonstoua que a equipe de Dantas interessou-se no material publicado por ele e não que repassou para ele para vê-lo publicado. Ademais, se o pessoal de Dantas tivesse repassado a informação, para que um email solicitando a tradução dos documentos? Será preciso desenhar para entender?

Na página 153 consta o seguinte trecho: Também, o testemunho dele – que novamente é secreto – foi vazado por Nassif (jornalista que é contratado agora por IG, controlado por BT e por que muito tempo foi envolvido em campanha de difamação contra nós

Curiosamente, aqui menciona Nassif vazando informações de um testemunho sigiloso de um processo igualmente sigiloso, porque tinha uma campanha contra Dantas e o processo especificamente era contra Demarco, adversário de Dantas.

É bom relembrar que Mainardi demonstrou em sua coluna (que foi uma resposta ao ataque de Nassif contra ele, por ter aberto o off, ou exposto uma fonte que pediu sigilo), que Nassif copiou como parte de uma reportagem um email de Demarco para ele até com os mesmos erros de grafia. A partir de então começou a guerra entre os dois.

Seguindo a série de exemplos de emails são apesentados trechos de mensagens em inglês e depois a tradução delas. Em um deles cita: Também, ontem Amália lhe enviou uma tradução de um artigo do jornalista Diogo Mainardi. Você deveria acessar o endereço na web indicado. Aparentemente este é um relatório de promotores italianos que se referem à corrupção no Brasil. Isso parece muito útil.

Esse trecho mantém o mesmo diapasão dos anteriores, ou seja informando da existência de um artigo de Mainardi e o acesso a documentos da justiça italiana que poderiam ser úteis.

É lógico que, diferentemente do que pensa Nassif, não foi Dantas e seu “bando” que forneceram dados para Mainardi, mas se aproveitaram dos dados cavados nas reportagens de Mainardi.

Ora bolas, solicitar a tradução é justamente o que Nassif também pediu em seu blog para seus leitores que soubessem italiano. Porque o interesse de Nassif é legítimo e ético e o do pessoal de Dantas não?

Nassif enxerga nisso uma grande teoria conspiratória no qual Dantas alimenta de informações Mainardi para então uma vez publicadas, usá-las na sua defesa em processos judiciais.

Pergunto: um documento se torna mais oficial, verdadeiro ou fundamentado porque foi exposto na mídia primeiro? Ou um documento por si só, pode ter essas qualidades? Claro que a segunda opção é a mais correta e de posse de informações importantes remetê-las diretamente à sua defesa sem precisar dessa pantomima seria o mais correto. A fantasia exposta a realidade perde o impacto não é mesmo?

Aliás, consideremos que Mainardi fosse realmente, nas palavras de Nassif, um jornalista-cela de Dantas. Com tantos grampos e escutas rigorosamente de todos os componentes da equipe de Dantas entre outros, porque em nenhuma delas aparece uma conversa telefônica ou email demonstrando que Mainardi estava sendo “cavalgado”? E antes que alguém replique, já respondo: Se houvessem, porque o delegado não os utilizou como exemplo, já que no final da página 150 e inicio da página 151 (numeração impressa), o relatório afirma: Os diversos relatórios de interceptação telefônica e telemática trouxeram tópicos específicos sobre o tema. Reproduzirei apenas algumas mensagens e áudios, pois é impotante chamar atenção para o tema, uma vez que poderá ter influência na repercussão após a execução deste trabalho.

É obvio a qualquer um que leia com o mínimo de isenção, que Dantas interessou-se pelos artigos de Mainardi naquilo que podia atacar seus adversários mas silenciou quando esses mesmos artigos o atacavam. Ora se existem gravações de emails e telefonemas de Dantas e Cia bela orientando Mainardi, é claro que teriam sido usados pelo delegado. Como não existem, mas o relatório foi fortemente embasado nos ataques de Nassif, era necessário torcer e interpretar a “relação” de Dantas e Mainardi.

Em trecho posterior usa um email de Adriana de Abreu para indicar que a imprensa era orientada. Como o email fala em orçamento, estaria sendo paga também? O que achei interessante é que o email não relaciona os alvos constantes de Nassif como Mainardi, Janaina Leite, etc; mas cita o Jornal do Brasil e o Conversa Afiada que presumo ser o blog de Paulo Henrique Amorim.

O próximo exemplo dado foi um email com um editorial da Folha de São Paulo sobre o caso do dossiê FHC. Nesse caso, o relatório da polícia afirma que o Jornal Folha de São Paulo tem seu editorial pautado por Dantas e não porque a Folha de São Paulo faça oposição ao governo Lula. E quando ela fazia forte oposição ao governo FHC, ou ao governo do estado, de quem era a pauta então?

No próximo trecho menciona uma MNI (mulher não identificada), que é Janaina Leite. Em seu blog ela deu os detalhes da conversa que tratava da briga dela com Nassif. O inquérito cita esse trecho como exemplo, por conta, claro, da citação a Mainardi. A explicação de Janaina é bastante coerente (não vou reproduzir aqui, por conta do tamanho, é só acessar o blog dela).

Outro trecho, já foi elucidado por outros jornalistas, incluso Janaina Leite, é a primeira citação da jornalista Andrea Michael da Folha de São Paulo, citada por um membro da equipe de Dantas como estando atrás dele para fazer uma matéria encomendada.

O trecho segue informando que A Folha está querendo saber da desenvoltura de Daniel e quem o está ajudando, e o que ele iria fazer com o dinheiro que irá receber.

O termo “encomenda” significa a mando da redação. Segundo as explicações é um jargão do meio, da mesma forma que o termo “vendeu a reportagem” significa que ela foi aceita pelo editor. O trecho do relatório deixa isso claro porque cita “A Folha está querendo saber...”. Não precisa desenhar pra entender, não é mesmo?

Ademais, se a matéria é por encomenda, então deveria ser Dantas a procurar a jornalista e não o contrário.

Não sou jornalista, mas me orgulho de ter saído do segundo grau sabendo ler, escrever e interpretar textos, e o acima me dizem exatamente isso.

Segue depois outros trechos: Ricardo diz para Rodenburg que a nota da FOLHA foi prometida para sexta...

...Otani Aparecida Leite, provavelmente jornalista e esta diz: “eu acabei com a palhaçada” da história do LUIZ NASSIF...

No primeiro caso, seria bem mais interessante se o relatório mostrasse a tal nota da tal sexta posterior ao dia 09.04.08; porque se a informação pode ser entendida pelo que poderia ser de pior (matéria encomendada a favor de Dantas), também pode ser lida pelo que poderia ser de melhor (matéria com o outro lado ou a versão de Dantas em determinado assunto ou sei lá uma nota social, procura-se cãozinho perdido, vai saber). Apresentar o trecho do jornal com a nota citada é o que daria peso à afirmação de que se trata de matéria encomendada. Do jeito que está é só uma ilação e ilações, convenhamos, o inquérito está tão cheio delas que simplesmente tiram parte da credibilidade que o relatório deveria ostentar.

Quanto ao segundo trecho, verificar explicações, novamente coerentes no blog da Janaina Leite.

Em outro trecho, finalmente um exemplo do que pode ser uma relação muito próxima da imprensa com Dantas. Trata-se do Relatório 06/08 – STG áudios 2181288143 2008045122825 1 8029364.wav Em 25/04/2008,às 12:26:25s – HUMBERTO...GREENHALGH ter recebido de um jornalista (HUDSON CORREA), que é do Correio e da Folha de São Paulo, um e-mail sobre a matéria onde a PF diz que Daniel Dantas é alvo de investigação. A matéria trata de uma operação em andamento envolvendo Daniel Dantas, Naji Nahas...repassar informação...

A jornalista Andrea Michael foi acusada de fazer uma reportagem antecipando a investigação que resultou nesse inquérito. Pois bem, essa mensagem de áudio, demonstra que um colega com acesso à reportagem informou Greenhalgh. Ocorre que a gravação pelo que está transcrito envolveu o próprio Greenhalgh. Abrem-se então duas explicações ambas razoáveis embora excludentes: A primeira é que o jornalista, sendo contato de Greenhalgh, o avisou e esse por sua vez alertou a manada toda. A segunda explicação é que sendo a investigação tão grande com tantos investigados, cabia verificar com cada um seu lado ou ponto de vista e esse jornalista ficou encarregado de Greenhalgh. Este por sua vez começou a alertar a turma para ir atrás de informações.

Obviamente quem sou eu para dizer que essa ou aquela opção são as corretas, mas é fato que o inquérito ou relatório considera apenas a primeira opção, já que esse é a proposta desta parte do relatório.

A próxima conversa é em seqüência a anterior acima e não fica claro que jornalistas são informantes, mas que enviaram perguntas para serem respondidas por conta de uma reportagem que estava sendo feita.

Adiante;

O próximo texto cita novamente Janaina Leite. Este trecho específico gerou outra troca de tiros entre Nassif, Janaina e do franco-atirador Gravataí Merengue, que com lógica impecável atingiu Nassif na cabeça:

Ocorre que o trecho deixa claro que a Janaina estava escrevendo sobre a participação do BNDES na criação da BrtOi e a questão do endividamento e perguntou a Dantas se era uma situação similar ocorrida na Itália e Dantas confirmou.

O mesmo Dantas que ganhou quase um bilhão de dólares na transação.

Nassif usou um trecho dessa parte do relatório excluindo o trecho acima, porque Janaina sempre foi contra a operação e seu texto foi no sentido de destruir as alegações a favor da mesma. Nassif editou o trecho para demonstrar o quanto estava certo atacando Janaina em seu Dossiê VEJA.

Janaina replicou o texto mostrando o trecho inteiro do relatório mas antes disso, Gravataí Merengue no blog Imprensa Marrom, desconstruiu sem dó o post de Nassif demonstrando a desonestidade dele na citação dos fatos.

Nassif se esqueceu que uma vez publicado na internet, qualquer um teve acesso ao relatório, como eu tive, vejam vocês; e que não duraria muito a sua, digamos assim, “revelação dos fatos”.

E porque Nassif editou ou escolheu só um pedaço do trecho citado no relatório? Porque a parte desconsiderada cita o BNDES que é órgão estatal que emprestou uma grana preta para Nassif e depois a renegociou dentro de um processo judicial de cobrança em condições extremamente positivas para o devedor, Nassif. A considerar que o BNDES também é uma das instituições que vira e mexe patrocina as atividades dele, em outras palavras, paga seu salário, seus honorários, escolha o nome que queira dar; ficaria ruim mostrar que o BNDES é citado no relatório em uma situação na qual entra com a possibilidade grande de perder dinheiro na transação (fusão da BrtOi). A citação demonstra qual a intenção da jornalista em falar com Dantas. Retirado o texto, fica-se com a errõnea impressão de que Janaina Leite era orientada por Dantas.

Na seqüência, o relatório fala sobre vazamento de informações.

Como já foi demonstrado, o furo de reportagem da jornalista Andrea Michael, se foi passada para Dantas, o foi por outro jornalista e mesmo assim, a título de investigação. É plenamente razoável e possível essa explicação.

Neste trecho, como a reportagem dava detalhes, nomes e fatos que realmente estão no relatório e as pessoas citadas foram realmente presas; o relatório sentencia que a jornalista vazou a informação e a partir daí, a quadrilha de Dantas passou a se mexer para evitar o pior, serem presos.

Afinal, queria o delegado o quê? Que eles aguardassem os acontecimentos e quando os citados fossem acusados e presos aí tentar se proteger? O que queria o delegado que a jornalista ou mesmo o Jornal Folha de São Paulo, fizessem? Que esperassem os acusados receberem voz de prisão para então dar a notícia numa espécie de diário oficial dos fatos ocorridos? A Folha recebeu as informações, investigou e virou notícia. Ponto. Fez o papel dela.

O que o relatório não diz é quem vazou a informação para a jornalista. Porque médium ela não deve ser, não é mesmo? Conseguiu a informação aonde? Em uma taboa ouija, cartas de tarô ou jogando búzios? É obvio que alguém de dentro da polícia é que vazou a investigação.

Diga-se mais, o requinte de detalhes foi tanto, que somente um policial por dentro da investigação poderia tê-lo feito. Ora, se o delegado encarregado, segundo o que a imprensa noticiou fez a coisa debaixo de bombardeio da própria polícia, usando pessoal da ABIN; quem vazou só pode ter sido alguém de dentro de sua equipe. Pergunta-se então: Se esse inquérito é sigiloso e a políciais são por natureza funcionários públicos; porque não houve o devido aperto na equipe diretamente relacionada para saber quem deu com a língua nos dentes? Porque não pediu ao juiz maiores investigações para saber quem quebrou a lei ao passar as informações sigilosas para a imprensa e processa-lo?

Nada disso é feita salvo pedir ordem de prisão para a jornalista e apreensão de documentos em sua residência; coisa que o juiz sensatamente recusou, assim como recusou toda essa parte do relatório contra a imprensa.

Outro dado interessante é que apesar do relatório citar Mainardi, Janaina, Andrea Michael como jornalistas a serviço de Dantas, dando “corroboração” às acusações ( que ao meu ver influenciaram o relatório), de Luis Nassif; o quadro de pessoas físicas cujo sigilo fiscal foi solicitado, não consta o nome de nenhum dos jornalistas citados. Vejam lá no ultimo bloco de PDF.

É de se convir, por uma questão de respeito à lógica, que os jornalistas citados como exemplos de assassinos de reputações, a soldo de Dantas, etc, deveriam ter seus sigilos quebrados para verificar se o que percebem como salário está compatível com a renda declarada e se receberam dinheiro de Dantas.

Acho muito estranho que depois de um sem número de páginas demonstrando que há jornalista a soldo de Dantas, que nenhum deles seja denunciado, como se realmente estivessem a soldo de Dantas, porém nada receberam dele; trabalharam de graça. Logo merecem um pito do juiz e não processo. Têm cabimento? Não!

Por essa razão, parece a mim, um mero leigo, que esse trecho do relatório sobre a imprensa teve fundamento muito mais militante que outra coisa, até porque em tese, os jornalistas citados possuem como ligação:

a) a objeção ao processo de fusão da BrtOi e;

b) objeção ao governo Lula em maior ou menor grau.

O delegado autor dessa investigação e relatório era e é militante o que explicaria a aderência as acusações contidas no Dossiê VEJA, pelo menos no espírito delas ou na sua essência.

Fatos mesmos, daqueles contra os quais não há argumento, não encontrei nenhum, muito pelo contrário.

Claro, não sou tonto de dizer que não existem jornalistas a soldo de Dantas, pagos por ele ou que defendem seus interesses. O que acho é que esse documento, relatório, inquérito, seja lá o nome que se queira dar não aponta uma única prova de isso ocorra, embora saibamos que possa ocorrer; e deu um atestado aos jornalistas citados, porque as citações em nenhum momento os implicam nem em conduta ílicita muito menos em conduta criminal.

É isso!


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