Lógica da reciclagem é fragilizada pela crise que atravessa o setor
Gilles van Kote
Até o outono, o setor de reciclagem vivia um sonho: avanço de dois dígitos da atividade e do faturamento; preço das matérias-primas secundárias (provenientes da reciclagem) em alta constante; imagem na crista da onda ambiental... Mas, em setembro de 2008, com a crise, tudo parou: "A demanda sumiu", diz Christophe Cros, diretor-geral da Suez Environnement. "A queda dos preços não mudou nada: não há mais demanda".
O efeito se sente hoje no planeta como um todo. Na China, milhões de trabalhadores, cuja atividade consistia em fazer a triagem de lixo vindo de países ricos, perderam seus empregos da noite para o dia. Na Europa e na América do Norte, os estoques de papel, metal e plástico reciclável se amontoam. "De cinco a seis navios de sucata que partiam todo mês para a Turquia, o principal importador mundial, passamos a um ou dois", garante Claude Platier, porta-voz da Federação das Empresas de Reciclagem (Federec).
O faturamento das empresas francesas de reciclagem registrou um recuo de 33% no quarto trimestre de 2008, em relação ao mesmo período de 2007. No primeiro semestre de 2009, 2.400 empregos (em 32 mil do setor) estariam ameaçados. E as perspectivas da atividade permanecem incertas.
É todo o equilíbrio do setor que está sendo reconsiderado pela crise, e, através dele, a estabilidade do setor de triagem, coleta e reciclagem de lixo. "Nós temos duas fontes de renda: as matérias-primas que revendemos, e o serviço de retirada que cobramos do intermediário do lixo", explica Jean-Luc Petithuguenin, proprietário da empresa Paprec. "Se você vende a tonelada de papelão por volta de ? 100, você pode não cobrar nada do intermediário. Mas quando ela está a ? 20, como hoje, não vale a pena ir buscá-lo se você não conseguir ganhar ? 30 ou ? 40 complementares pelo serviço".
Resultado: em vez de pagar, os detentores intermediários de lixo que podem, o armazenam, esperando por dias melhores. Os carros se amontoam no setor, uma vez que o preço atual dos metais e das matérias plásticas não justificam mais economicamente seu desmantelamento. O preço da sucata subiu para ? 480 a tonelada em julho de 2008. Ele abaixou para menos de ? 100 no fim de 2008.
"O setor de reciclagem descobriu que as matérias-primas podem estar sujeitas a variações muito grandes", constata Philippe Chalmin, professor na Universidade Paris-Dauphine. "Esse golpe poderá levar a uma revisão da área, obrigando os absolutistas da reciclagem a serem menos exigentes. A reciclagem não é a única solução: a incineração com recuperação de energia pode ser uma alternativa inteligente do ponto de vista econômico".
Em um estudo publicado na segunda-feira (23), a empresa de consultoria em estratégia Frost & Sullivan crava mais um prego no caixão: a crise do setor "pode levar a uma disparada nos preços da reciclagem, o que reduziria seu atrativo econômico", escrevem os autores, ressaltando que no Reino Unido o preço da tonelada de papel coletado já aumentou £ 20.
A curto prazo, por falta de perspectiva de um aumento rápido nos preços, existe também o risco de ver os armazenadores de lixo perecível tentando se livrar dele, enviando-o para um depósito ou um incinerador. A presidência tcheca da União Europeia se alarmou com o fato em uma nota em 25 de fevereiro. Para sustentar o setor, ela sugere "manter os objetivos existentes em matéria de reciclagem", pedir para os cidadãos que não deixem de fazer a triagem, e estudar a possibilidade de uma redução do IVA (imposto sobre o valor adicionado) para determinados produtos a base de materiais reciclados.
Apesar da gravidade da situação, os agentes do setor parecem continuar relativamente confiantes. "Por que a reciclagem progrediu tanto em 25 anos? Porque é uma solução econômica, comparada com outros modos de gestão de lixo", acredita Petithuguenin, da Paprec. "Se me perguntarem se o setor de reciclagem corre o risco de acabar, minha resposta é não. Ele sofre, mas trata-se de uma fase de ajustes de preços".
Na Suez Environnement, Christophe Cros também adota esse ponto de vista: ele acha que o mercado saiu de um período especulativo que viu os preços atingirem picos artificiais e que hoje chega a "preços que não estão em níveis anormais".
As tensões do setor não deverão ter repercussões diretas para o cidadão comum: o setor de coleta seletiva do lixo doméstico é financiado pelas empresas que comercializam produtos embalados, e as comunidades locais dispõem de cláusulas que lhes garantem a retirada dos lixos recicláveis. "Pedir que as pessoas façam mais ou menos triagem em função da conjuntura não faria sentido", acredita Carlos de los Llanos, diretor do departamento técnico e ambiental da Eco-Emballages.
Tradução: Lana Lima
Até o outono, o setor de reciclagem vivia um sonho: avanço de dois dígitos da atividade e do faturamento; preço das matérias-primas secundárias (provenientes da reciclagem) em alta constante; imagem na crista da onda ambiental... Mas, em setembro de 2008, com a crise, tudo parou: "A demanda sumiu", diz Christophe Cros, diretor-geral da Suez Environnement. "A queda dos preços não mudou nada: não há mais demanda".
O efeito se sente hoje no planeta como um todo. Na China, milhões de trabalhadores, cuja atividade consistia em fazer a triagem de lixo vindo de países ricos, perderam seus empregos da noite para o dia. Na Europa e na América do Norte, os estoques de papel, metal e plástico reciclável se amontoam. "De cinco a seis navios de sucata que partiam todo mês para a Turquia, o principal importador mundial, passamos a um ou dois", garante Claude Platier, porta-voz da Federação das Empresas de Reciclagem (Federec).
O faturamento das empresas francesas de reciclagem registrou um recuo de 33% no quarto trimestre de 2008, em relação ao mesmo período de 2007. No primeiro semestre de 2009, 2.400 empregos (em 32 mil do setor) estariam ameaçados. E as perspectivas da atividade permanecem incertas.
É todo o equilíbrio do setor que está sendo reconsiderado pela crise, e, através dele, a estabilidade do setor de triagem, coleta e reciclagem de lixo. "Nós temos duas fontes de renda: as matérias-primas que revendemos, e o serviço de retirada que cobramos do intermediário do lixo", explica Jean-Luc Petithuguenin, proprietário da empresa Paprec. "Se você vende a tonelada de papelão por volta de ? 100, você pode não cobrar nada do intermediário. Mas quando ela está a ? 20, como hoje, não vale a pena ir buscá-lo se você não conseguir ganhar ? 30 ou ? 40 complementares pelo serviço".
Resultado: em vez de pagar, os detentores intermediários de lixo que podem, o armazenam, esperando por dias melhores. Os carros se amontoam no setor, uma vez que o preço atual dos metais e das matérias plásticas não justificam mais economicamente seu desmantelamento. O preço da sucata subiu para ? 480 a tonelada em julho de 2008. Ele abaixou para menos de ? 100 no fim de 2008.
"O setor de reciclagem descobriu que as matérias-primas podem estar sujeitas a variações muito grandes", constata Philippe Chalmin, professor na Universidade Paris-Dauphine. "Esse golpe poderá levar a uma revisão da área, obrigando os absolutistas da reciclagem a serem menos exigentes. A reciclagem não é a única solução: a incineração com recuperação de energia pode ser uma alternativa inteligente do ponto de vista econômico".
Em um estudo publicado na segunda-feira (23), a empresa de consultoria em estratégia Frost & Sullivan crava mais um prego no caixão: a crise do setor "pode levar a uma disparada nos preços da reciclagem, o que reduziria seu atrativo econômico", escrevem os autores, ressaltando que no Reino Unido o preço da tonelada de papel coletado já aumentou £ 20.
A curto prazo, por falta de perspectiva de um aumento rápido nos preços, existe também o risco de ver os armazenadores de lixo perecível tentando se livrar dele, enviando-o para um depósito ou um incinerador. A presidência tcheca da União Europeia se alarmou com o fato em uma nota em 25 de fevereiro. Para sustentar o setor, ela sugere "manter os objetivos existentes em matéria de reciclagem", pedir para os cidadãos que não deixem de fazer a triagem, e estudar a possibilidade de uma redução do IVA (imposto sobre o valor adicionado) para determinados produtos a base de materiais reciclados.
Apesar da gravidade da situação, os agentes do setor parecem continuar relativamente confiantes. "Por que a reciclagem progrediu tanto em 25 anos? Porque é uma solução econômica, comparada com outros modos de gestão de lixo", acredita Petithuguenin, da Paprec. "Se me perguntarem se o setor de reciclagem corre o risco de acabar, minha resposta é não. Ele sofre, mas trata-se de uma fase de ajustes de preços".
Na Suez Environnement, Christophe Cros também adota esse ponto de vista: ele acha que o mercado saiu de um período especulativo que viu os preços atingirem picos artificiais e que hoje chega a "preços que não estão em níveis anormais".
As tensões do setor não deverão ter repercussões diretas para o cidadão comum: o setor de coleta seletiva do lixo doméstico é financiado pelas empresas que comercializam produtos embalados, e as comunidades locais dispõem de cláusulas que lhes garantem a retirada dos lixos recicláveis. "Pedir que as pessoas façam mais ou menos triagem em função da conjuntura não faria sentido", acredita Carlos de los Llanos, diretor do departamento técnico e ambiental da Eco-Emballages.
Tradução: Lana Lima
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