Vladimir Safatle é professor na USP escreveu um artigo usando como pretexto a operação da polícia na cracolândia para criticar o atual governo paulista.
Não vou entrar no mérito da questão real, que é a oposição partidária do qual esse professor faz parte, mas avaliar o texto que foi publicado na Folha de São Paulo. Se as aulas que esse professor leciona na USP tem o mesmo apuro com que escreve, penso que seus alunos são seriamente prejudicados.
Ao texto:
O governador de São Paulo parece ser um daqueles que rezam pelas
virtudes curativas do porrete da polícia. Não é de hoje que ele expõe a
sociedade às "ações enérgicas das forças da ordem", mesmo que a
eficácia de tais ações muitas vezes seja próxima de zero.
O autor começa fazendo uma afirmação subjetiva. Entretanto, como o objetivo é criticar o governo e não fazer uma avaliação concreta dos supostos casos de violência policial ou estado policialesco, o autor tentará estabelecer um padrão de fatos sem nenhuma ligação direta entre si para que se pareçam um padrão de comportamento e ação e assim fundamentar a acusação.
Há anos, sua polícia envolveu-se em uma operação para exterminar líderes
do PCC, isso no caso conhecido como "Castelinho". "Estamos
definitivamente livres do PCC", afirmava solenemente o secretário da
Segurança. Anos depois, o mesmo PCC parou São Paulo em uma das mais
impressionantes demonstrações de força do crime organizado.
Esse "há anos", foi em 2002. A operação foi prender um grupo de bandidos do PCC que estavam armando um assalto gigantesco. A polícia interceptou os seis veiculos, entre eles um onibus e foram recebidos a bala. Os marginais possuiam coletes a prova de bala e armamento pesado. No confronto morreram 12. A turminha da esquerda e de oposição para ter o que criticar acha que a policia deveria receber os marginais com flores ou atirando para o alto. Na cabeça torta dessa gente, conflito equilibrado seria se 12 policiais ou mais fossem mortos no confronto. Depois o equilibrado articulista declara emocionado que o PCC atacou parando São Paulo. Eu pessoalmente, chamaria o evento de terrivel, temeroso, horriveis, e por ai vai. Impressionante como se tivesse sido um cataclisma da natureza dificilmente. As palavras obviamente indicam a escolha ideológica do discurso, e como se sabe, militância e equilibrio análitico nunca andam de mãos dadas. No RJ, as favelas foram "limpas" de traficantes com o uso das forças armadas e policia e criaram as operações de pacificação. Menos de um ano depois, uma das favelas voltou a apresentar confrontos entre traficantes e policiais e o articulista é todo elogios a politica do governo de lá, porque coincidentemente é partido de apoio do governo. Aqui, a policia mata 12 marginais do PCC, três anos depois ele atacam delegacias em SP e o articulista, muito sério, acha que o segundo movimento é reação ao primeiro e tudo culpa do governo paulista.
Mais ou menos nessa época, militantes de direitos humanos se mobilizaram
para exigir o afastamento de membros da polícia acusados de praticar
tortura na ditadura. Expressiva maioria dessas demandas permaneceu letra
morta.
É aquela velha estória. Se a anistia considerou anistiados os envolvidos nos dois lados da disputa, como afastar da corporação, alguem supostamente envolvido em uma ação que foi anistiada? Se o STF já julgou o caso e o relator foi um juiz que na juventude foi preso e torturado, fica facilmente comprovado que o eterno discurso é feito, não para apresentar resultado concreto, mas para ser usado nesse tipo de argumentação, no qual o enunciante é sempre marcado como ao lado do bom, do belo e do virtuoso e o outro, seguindo e amparado em lei, é emissário do mau e de tudo que é diabólico.
Só nos anos de 2011 e 2012 vimos mais dois exemplos patéticos de atuação
de uma polícia que sempre gostou de confundir segurança com
demonstração histérica de força. A primeira ocorreu na USP.
Após a intervenção policial no desalojamento de estudantes que invadiram
a reitoria, cresceram denúncias de maus-tratos praticados por
policiais.
Chegamos na peça de resistência do articulista. A polícia obedeceu uma ordem judicial solicitada pela administração da USP, porque o prédio da reitoria que é um prédio público estava tomando visando como sempre um movimento político. Não houve uma troca de socos, um tiro de borracha, nada, porque a força policial que é a institucionalmente e democráticamente definida para cumprir e fazer executar as leis, estava em maior número que os invasores. O articulista acha que deveria ter sido enviado um agrupamento de escoteiros e bandeirantes, talvez noviças de um convento. Só rindo mesmo. Uma pesquisa séria que qualquer um pode fazer na web, demonstrará a destruição de propriedade pública que os invasores perpetraram. Segundo o blog do Reinaldo Azevedo, a fazenda da familia do articulista foi invadida e eles tomaram a mesma providência que a USP, entraram com pedido de reintegração de posse. Se os invasores se recusam a obedecer a ordem judicial, ele impedirá que a policia faça cumprir a ordem do juiz? - Pois é!
O último capítulo foi a recente e inacreditável cena de um policial com
arma em punho ameaçando um estudante: prova cabal do despreparo de uma
corporação acostumada a atirar primeiro e pensar depois. A sociedade
deveria ler com mais calma os estudos que se avolumam nas universidades
sobre violência policial.
O que ele não conta é que o policial foi imediatamente afastado do trabalho e está respondendo o devido processo legal. Já a vítima, que é estudante profissional da USP e milita nesses grupelhos, não é uma vítima somente do malvado policial, já que é estranho que estivesse trabalhando em um bar instalado em local público quando deveria naquele momento estar assistindo aulas.
Agora, fomos obrigados a assistir a uma incrível intervenção na chamada cracolândia.
O que ele chama de incrivel, no sentido negativo da palavra, é uma ação policial para acabar com aquilo que por anos foi tema de reportagens e denúncias em televisão, um pedaço da cidade entregue ao tráfico e vício de drogas. Com a ação policial, traficantes foram presos e quantidades enormes de drogas foram apreendidas.
Nada adianta a maioria dos profissionais de saúde mental insistir no
absurdo que significa tratar uma questão de saúde pública como um
problema de segurança. Nada adianta lembrar que a maioria das pessoas
nessa região não são traficantes. São, na verdade, usuários, que devem
ser tratados não a bala, mas em leitos de hospital. Afinal, há uma
parcela da população que se excita quando vê a polícia "impondo a
ordem", por mais teatral e ineficaz que seja tal imposição. Para tal
parcela, a polícia é um fetiche que serve para embalar o sonho de uma
sociedade de condomínio fechado.
Raciocinio não é privilégio nato de anos de estudo como se vê. O vício definitivamente é uma questão de saúde pública, mas o tráfico de drogas, o marginal que fornece e alimenta o vicio é um problema de segurança. Levada na prática e ao pé da letra a como direi, idéia do sujeito, deveriámos instalar hospitais e médicos ao longo da fronteira e deixaria de haver o tráfico vindo da Bolivia. Embora seja verdade que a maioria das pessoas não sejam traficantes, alguns são, afinal qual outra razão para tantos viciados se aglomerarem nas mesmas ruas? E que se note, viciados não foram presos, salvo os que resolveram enfrentar a policia, instigados em boa parte por essa turma militante. O governo deveria ser audacioso e deixar esse pessoal tomar as decisões relacionadas com o tema no lugar do governo. Voce leitor, tem idéia de qual seria o resultado? Pois é.
Se tais pessoas, ao menos, se lembrassem de Philippe Pinel, o pai da
psiquiatria moderna, talvez elas entendessem o valor nulo de tais ações
policiais, assim como da defesa de políticas de "internação
compulsória" de viciados.
A lei proibe internar alguem contra sua vontade. Logo é preciso estrangular a lberdade de ir e vir do traficante de drogas. O viciado uma vez que não consegue sua dose, pode estar propenso a procurar ajuda. Mas pense, qual discurso convincente é possivel fazer que convença alguem que está com o cérebro dilacerado pela droga pensar de forma racional?
A dificuldade da situação é tão complexa que essa gente pródiga em criticar tudo, todos e qualquer coisa, deveria se oferecer para estudar idéias práticas que visem prejudicar em muito o tráfico de drogas, ajudar viciados a controlar sua necessidade (já que ninguem se cura), mas ao invés disso preferem as idéias modernas como fornecer seringa, local com higiêne, agua para que viciados usem drogas com segurança.
Aquele que é vítima de sofrimento psíquico (e a drogadição é um deles)
só será curado quando o terapeuta for capaz de criar uma aliança com a
dimensão da vontade que luta por se conservar como autônoma. Não será à
base de balas e internação forçada que tal aliança se construirá.
Balas até agora foram para criminosos traficantes. Ninguem até agora foi internado de forma compulsória. Sendo assim, porque a crítica; salvo o fato do governo em questão ser o paulista?
Nenhum comentário:
Postar um comentário